“Designam-se por pavilhões os distintos edifícios que constituem um estabelecimento prisional. Alguns recebem os nomes das funções ou serviços que acolhem, como Pavilhão da Administração, da Saúde, da Escola ou da Biblioteca. Outros, ainda, onde residem os reclusos, são dedicados a patronos ou reflectem o tempo de permanência no estabelecimento, como Pavilhão Infante Santo ou Pavilhão da Confiança. Quando se iniciou o projecto Ópera na Prisão no Estabelecimento Prisional de Leiria – Jovens, os ensaios decorriam no Pavilhão de São Paulo, mais vezes designado por Pavilhão 2. Mas, com o decorrer da sua primeira edição de 2014, identificou-se uma necessidade e semeou-se um sonho. A necessidade era a de ter uma sala de ensaios com condições para receber aulas de canto e onde se pudessem realizar oficinas de criação artística na área do teatro musical. O sonho era o de oferecer à cidade e região de Leiria uma sala de fruição cultural, não por acaso inserida num estabelecimento prisional. Num momento dramaticamente marcante das suas vidas, estes jovens vão poder experimentar a criação artística colectiva, juntar sons e imagens às suas palavras, e depois apresentar este trabalho aos seus colegas do estabelecimento prisional, mas também à comunidade em que este se insere. No dia 8 de Janeiro inaugura-se este novo pavilhão, cumprindo a primeira necessidade identificada, a de uma sala de ensaios. Mas, antes de terminar 2021, dar-se-á cumprimento ao sonho, abrindo este espaço à comunidade com uma produção artística concebida em co-criação com reclusos, famílias, equipas técnicas e de segurança, bem como profissionais das artes.
Na sua origem, o espaço agora recuperado era uma encadernação, de que se guarda ainda o painel de azulejos sob o portão de entrada. Integra um complexo maior com outros pavilhões, como a tipografia ou a sapataria. Dos livros que ali se encadernaram, permanecem naquelas telhas e paredes as palavras e as ideias de muitas histórias, diários da república e da poesia que ali se coseu de linha e papel. Quando se foram os livros, o pavilhão recebeu outra ocupação, e com isso, outro nome. Os reclusos ali tinham actividades de tecer panos novos de tecidos velhos, e o Ópera na Prisão, quando conheceu este espaço, o mesmo recebia o nome de “Pavilhão dos Trapilhos”. Depois de cantar tantos dramas humanos em duas das óperas de Mozart, o Don Giovanni e o Così fan Tutte, pareceu-nos que se deveria baptizar de Pavilhão Mozart o espaço que agora irá tecer dramas e paixões humanas pelas mãos das artes performativas.
É um espaço modesto, de dimensões camerísticas, que nestes tempos de Covid não consegue albergar mais de uma dúzia de pessoas. Mas, contempla uma sala de ensaios e concertos, bem como um pequeno espaço de produção em que os reclusos podem iniciar-se nas tarefas de preparar e comunicar para a comunidade os projectos que aí irão realizar. Este sonho tornado realidade não seria possível sem a abertura que desde o primeiro momento a direcção do EPL-J e a Direcção Geral dos Serviços Prisionais ofereceram à ousadia de ter um espaço dedicado à Ópera dentro de uma prisão. Depois, deve sublinhar-se a capacidade transformadora do programa PARTIS da Fundação Calouste Gulbenkian, que foi o grande impulsionador do Pavilhão Mozart, mas acima de tudo das ideias e “modus operandi” que o alicerçam. Em boa hora, o projecto ganhou uma nova escala com o apoio do Portugal Inovação Social e da Fundação Caixa Agrícola, e devemos referir ainda os parceiros de todas as edições do Ópera na Prisão, como o Município de Leiria, e as muitas pessoas colectivas e individuais que, desde o primeiro momento, apoiaram e estimularam este projecto.
Mas, o impacto deste Pavilhão já ultrapassou fronteiras, e na sua inauguração vamos poder assistir à estreia de algum do equipamento com que vai ser apetrechado. Numa candidatura a um programa europeu Horizonte 2020, um Consórcio de nove parceiros está a trabalhar para desenvolver ferramentas tecnológicas de realidade virtual. O Pavilhão Mozart, lado a lado com o Grande Teatro El Liceo de Barcelona e da Ópera Nacional Irlandesa, é palco desta investigação que coloca a tecnologia de ponta aliada à ópera ao serviço do impacto social. A SAMP e toda a sua equipa muito se orgulham deste caminho e agradecem com profundo reconhecimento a todos os que permitiram a construção do Pavilhão Mozart, e do que com ele se lhe vai seguir.”
Paulo Lameiro, Coordenador do Projeto SAMP Pavilhão Mozart – Ópera na Prisão